terça-feira, 1 de setembro de 2009


MINE TEXTO PARA TEATRO


“GAFEANDO NA INFORMÁTICA”




PERSONAGENS:

Clara Bela

Marilu




Clara = Chega Marilu! Já me basta mãe com aqueles nhê, nhê, nhês dela o dia todo e agora vem tu, mulher, com essa história absurda. Uma mulher que pariu chupando uma manga bacuri. Me poupe Marilu, me poupe.

Marilu = Mas foi verdade Clara Bela. A sua mãe conhece a mulher que mora perto do açude do bebo, e não tinha quem fizesse ela soltar o caroço da fruta. Se acha que é mentira, pergunte a sua mãe.

Clara = Você e mãe são duas bobinhas pra acreditarem nessas besteiras. Alô! Acorda Marilu pra o mundo, menina. Tudo hoje é real minha amiga e não dá mais pra acreditar mais em papai Noel... Não me atrapalhe Marilu, quando eu estiver na linha do raciocínio plugado. Má, será que tu não vê que hoje, essa euzinha que está aqui na sua frente está é letrada, e que tu foi para a minha formatura, e que agora não sou mais uma qualquer, que estou evolutiva, que me tornei uma nova mulher, lapidada, informatizada, quase uma seleta pensadora dessa comunidade, com sérias pretensões de sair candidata a uma das vagas na câmara dos vereadores nas próximas eleições e depois disso, ninguém me segura. Será Clara Bela e o mundo.

Marilu = O que não faz um curso de introdução a informática.

Clara = Sim, e daí Marilu. Quem nessa terrinha, nesse fim de mundo tem esse importante curso que eu fiz? Diga-me Marilu, quem? Quem saiu daqui a pingo do meio dia, pegando carona e muita das vezes indo quase todo o caminho a pé, lá pra Macaíba, fazer esse curso que hoje me possibilita, ou melhor, me capacita sem o menor medo de errar, de ligar e desligar qualquer computador que seja, sem o menor medo de gafear, me responda Marilu? Claro que não vai responder por que só euzinha que corri atrás sem em nenhum momento gafear..

Marilu = E o que significa gafear, doutora Clara Bela? Ou tas inventando palavras.

Clara = Marilu, mulher, eu sou lá louca de inventar as coisas. A bichinha. Às vezes eu fico com tanta peninha de você, minha amiguinha. Será que você não percebe que os meus traquejos, que o meu linguajar é internetiano e que minha a minha cabecinha agora pluga no mundo da computação.

Marilu = Mas gafear, eu nunca ouvi falar.

Clara = Claro, né, Marilu, sua tontinha. Oh, meu pai, como eu tenho peninha. Presta atenção Marilu o que eu vou relembrar pra você, mas se você não entender pode deixar que eu faço um desenho. Presta atenção; sabe aquelas metidas que eu sempre falava pra você lá do curso, aquelas da formatura de nariz empinado, que ficavam sempre em grupinho e vez por outra olhavam pra gente e riam, lembra?... Aquelas chatas que eu gritei nas funsas delas no dia da formatura que eu era a melhor da turma, você ta lembrada?

Marilu = E gritou mesmo.

Clara = Graças a Deus que já sabe quem é. Pois é Marilu, eu gritei mesmo e gritaria quantas vezes precisasse só pra aquelas deleiteiras se tocarem, criarem vergonha na cara e não ficassem rindo de ninguém! E tem mais, eu gafiei na sociedade internetiana plugarista, mas lavei o meu peito quando o professor me deu o telefone para os agradecimentos. Foi a mim que ele entregou minha querida.

Marilu = O microfone, Clara Bela.

Clara = Ta vendo Marilu como eu fico quando falo naquelas deleiteiras. Até o nome das coisas eu troco. Toda vez que falo naquelas filhas do zombeteiro eu fico nervosa e termino gafeando.

Marilu = Calma Clara.

Clara = Calma o que Marilu! Como é que eu posso ficar calma depois do que aquelas tisgas, aquelas sapiricas do priquito seco fizeram comigo. Mas eu me vinguei. Ta lembrada? Aproveitei a hora dos agradecimentos e disse pra todo mundo ouvir que elas viviam no lado de fora se atracando com os machos e que na hora da prova um certo alguém ganhava presentes pra facilitar as respostas.

Marilu = Mas todo mundo entendeu que era o professor.
Clara = E eu lá me importo Marilu. Depois do que tinha acontecido comigo, era pra se rear tudo no meio mesmo. Eu já tava formada e diplomada, passei com o meu esforço, com mérito, não devia a ninguém. E você sabia que mãe achou muito bem feito o que eu falei e me disse mais, que era pra ter dito o nome daquele safado, daquele tarado, gostoso... E de besta que eu não falei.

Marilu = E o gafeado entra como nessa história?

Clara = Sim Marilu, eu já tava até me esquecendo. Ta vendo, é só falar naqueles troços, eu fico assim, toda me tremendo só de ódio. Sobe a pressão Marilu, os nervos, tudo. Se aquele curso custasse mais um dia eu, matava ou morria de tanto ódio. Ta vendo Marilu, já quero ficar rouca.

Marilu = Então vai mudar de assunto?

Clara = É impossível Marilu! Principalmente depois que eu soube que tinha ganhado uma bolsa pra a etapa seguinte, onde o vereador Dedé conseguiu, sem eu gastar nada Marilu. Eu ia ficar realmente doutora no assunto. Quando eu soube, caí durinha e passei mais de hora pra tornar, mas mãe me conhecendo, e sabendo que eu não tenho papa na língua, me aconselhou que no lugar do curso, o vereador me desse a chapa dentária, que é essa que eu to usando.

Marilu = Não precisa tirar Clara Bela.

Clara = É limpinha, Marilu. Tu ta me chamando de sebosa, e?

Marilu= Claro que não. Mas deixe onde está que está bem melhor.

Clara= E tudo isso agradeço a aquelas três, cavalos do cão que acabaram com a minha carreira profissional. Mas não tem nada não Marilu, porque mais tem Deus pra me dar em dobro e tudo o que aquelas afilhadas do demo fizeram comigo, elas vão ganhar em dobro a do burro, a do lúcifer e vão ficar tudo prenha do capeta, aquelas estopô balaio.

Marilu = Quero morrer sua amiga. Que praga.

Clara = Praga Marilu? Essa nunca que foi uma praga. Você precisa ver quando eu me prosto no chão debaixo do sol quente, no pingo do meio dia segurando três folhas de pião roxo na mão esquerda pra a praga ir direto pra o infeliz e uma folha de comigo ninguém pode na mão direita pra nada pegar em mim e é tiro e queda. Viu Marilu, ai daquele ou daquela que eu, a praga jogar. Eu sou tão rancorosa Marilu que a pessoa me pedindo perdão de joelhos ou se ralando todinha no cimento carraspinhento, eu não perdôo.

Marilu = Santo Deus

Clara = E ainda mando se danar dos quinto dos infernos pra dentro, com o estopô balaio nas costas.

Marilu = E você ainda se diz filha de Santa Maria. Imagina se não fosse.

Clara = Espera lá Marilu que tu já ta confundindo. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é alguém pisar em meus calos. Tenha fé Marilu, porque ta pra nascer esse vivente nessa terra de meu Deus que agüente desaforo ou ser humilhada.

Marilu = Ta bom. Já não ta aqui quem falou.

Clara = Obrigada Marilu. Ainda bem que você ta aqui, me fez conversar, relaxar e já to me sentindo bem melhor. Até a minha pressão voltou ao normal... Ta uns seis por dezoito.

Marilu = Mas assim não é normal Clara Bela.

Clara = Marilu?!

Marilu = Santo Deus, porque eu falei.

Clara = Mulher, tu quer me ensinar, é? Tem horas que eu penso que tu não gostas de mim, e por isso tu tem uma pontinha de inveja.

Marilu = Nem em sonho, Deus me livre.

Clara = Tu acha que to falando por falar é Marilu? Eu já fui uma quase enfermeira Marilu, e tenho certeza que tu ta perguntando quando e de tão boa que eu sou vou lhe lembrar do tempo que passei no hospital com mãe. Marilu, tu pensava que eu ficava parada num canto chorando, me mal dizendo? Nunca minha filha, eu ficava ajudando a todo mundo ao ponto de um dia, lembro como hoje, eu tava com aquele conjuntinho branco...

Marilu = Que você passou os dois meses sem tirar ele do corpo.

Clara = E que em seguida você tomou emprestado. Mas continuando; pois Marilu um dia uma pessoa me confundiu com a médica de plantão, porque além de ta de branco, eu não parava, era resolvendo tudo e fiquei com tanta prática em verificar a pressão que só em pegar no pulso ou em qualquer parte do corpo eu já diagnosticava e era batata. Amiga, os médicos ficavam bestas, todo mundo, eu até me chateava de tanto me procurarem. Eu fui convidada pelo diretor pra ser a verificadora oficial da pressão dos pacientes, mas tu sabe como mãe é, ciumenta e ainda por cima o diretor tava me olhando com aquele olho de pidão, mãe percebendo tudo, que aquilo é muito viva, recebeu alta e me puxou de lá. Mas a fama correu o mundo e vinha doente na minha porta toda hora.

Marilu = Até no dia que seu Zuca morrer de hipertensão.

Clara = A desgraça da minha carreira. Mas também Marilu, ele já tava quase morto e eu não sou Deus, desenganei logo.

Marilu = E era uma simples dor de cabeça.

Clara = Marilu, aquele médico não sabia de nada! Tão botando médicos nos hospitais novinhos demais e eu disse nas funsas dele e calado tava, calado ficou. Levaram seu Zuca para o hospital porque quiseram, mas eu já tinha obitado ele. A bichinha, só eu falo né Marilu, mas faço esse grande esforço em nome de nossa amizade, na esperança que você aprenda a viver, aprenda a se defender e tenho certeza que você é louca pra passar o dia todo só aprendendo comigo, mas vá tentando e quem sabe você um dia vai ser igual a mim. Agora tem que estudar muito viu, pra não ficar gafeando por aí. Agora preciso ir Marilu, a bichinha... Fico morrendo de pena da bichinha, doida pra ser igual a mim. O que fazer, eu sou Clara Bela do Forte e Silva. Clara porque sou muito inteligente e Bela porque, modesta parte, eu nasci assim, né Marilu?

Marilu = Eu sou Marilu Ferreira da Silva, novata nesse lugar, estou aqui a sete meses, mas sempre morei na zona rural e quando meu pai faleceu eu vim morar com a minha avó, aqui nesse lugar. Estudei o ensino fundamental e médio em Macaíba e espero um dia fazer faculdade de Psicologia. É o meu sonho.

Clara = Meus Deus, como tenho pena dessa bichinha. Ela vive no mundo da fantasia, pensando uma coisa que nunca foi e sonhando com uma coisa que jamais será. Chega me dá vontade de chorar. Fique triste não Marilu, nada como um dia atrás do outro e eu no meio pra te ajudar.

Marilu = E gafear, significa o que pra você, afinal de contas?

Clara = Só pra mim não Marilu, mas pra o mundo inteiro que pluga no mundo da navegação virtual internetiana, mas desse assunto lingüístico internacionalizado eu lhe explicarei lá em casa lavando a louça.

Marilu = Mas eu...

Clara = Chega Marilu. Deixa de ser envergonhada. Tu não sabe que eu faço qualquer sacrifício pra você aprender mais. Vamos embora e ficarei muito feliz com você lavando a louça e eu te ensinando. A bichinha, gafea tanto. Como eu sofro ajudando os mais necessitados. Só espero Marilu que um dia você não faça como os outros e não me dê uma patada.

Marilu = Só se eu fosse louca.

Clara = A bichinha. Vamos Marilu.

Juscio
Macaíba 11/11/2003

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